106. Lispectoração II (Lispectografia)

Quando não estou em desespero,
o que faço? Sou dona de casa,
Quando estou, escrevo,
mas se não o faço,
vegeto.
Quando quero escrever,
é a mucosidade da irritação
que julgam ser em função dos vários cigarros,
nada me fazem,
se maleficiam dos meus males!
Porque as donas de casa
tanto se desesperam,
enquanto tem um cigarro entre os dedos?
Eu sei, porque escrevo.
Se ordeno a cozinha, estou longe de ser
indigesta, como quando escrevo,
sobre o incomodo
deste espírito que desemboca
no que não é essência.
Muitas vezes,
não é nada disso,
pois vegeto, sou dona de casa
e escrevo ao mesmo tempo, caoticamente,
não para confessar, mas
para falar ao próprio inconfessável.
Posso dizer que me entendo,
todas as palavras que usei
tinham ao menos dois significados,
um para mim e outro para os outros.
Para os entendidos,
razão dos outros serem,
dou-lhes golpes de capoeira, escurecidos
da razão que tenho das intelectualidades,
mais aptas ao entendimento do que faço.
Não sou profissional, não foi por opção,
Seria algo, que se não fosse pela memória,
teria desde sempre feito, desde de antes
da primeira lembrança, ou talvez desde antes de ter nascido,
daí crer que minha mãe inventou este momento,
do meu parto ter sido antes de ter me dado a luz,
de ter, em algum momento, me luzido.
Esta foi minha verdadeira opção,
a profissão do meu espírito,
a de eu mesma nascer-me das bocas das pessoas.
Algumas, ou mesmo muitas delas,
tem os destinos indo de encontro
com cartomantes, mas verdadeiramente,
suas sortes são depois de saírem,
das suas presenças, não os são,
mas atravessam-os, se iluminam,
e iluminam os corpos,
os mortos e os vivos.
Se antes de minha morte,
que as cartomantes não poderão prever,
por ser inconfessável, encontrar
com mortos-vivos, é porque são eles,
que sempre me atravessaram,
não o meu destino, que este ficou
com aquelas cartomantes,
mas estes meus nascimentos,
que insistem em, teimosamente, nascer.
São estes mortos-vivos os legítimos proprietários
de minhas profecias, latifúndios do futuro
para os retirantes da minha alma.
Alma que nunca tive, terra também não,
fui grilada, lispectografada que fui
das parcelas desprivilegiadas da humanidade.
O que eu sou foi um grande sim,
ou simplesmente sim.
Ou um sim,
ainda mais simples,
que é meu esqueleto,
enquanto minhas carnes eram não
para a presença ainda sentida
do meu inconfessável.

1 comentários:

Felipe Lobo dos Santos 23 de abril de 2009 às 08:15  

troquei:
dos vários cigarros,
que nada me fazem.
por:
que julgam ser em função dos vários cigarros,
nada me fazem,
se maleficiam dos meus males!

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A Lógica é a genética da preguiça de criar, e a criação precisa de intensidade sendo o exercício do impossível imediato, mas, às vezes, porque não sermos um pouco indolentes?

Não 'creio' na Lógica por causa dos Ateus. Os mais consistentes propagadores das leis de Deus.

Mesmo não sendo parnasiano...

“Fuja da abundância estéril desses autores, e não se sobrecarregue com um pormenor inútil. Tudo que dizemos a mais é insípido e degradável; o espírito saciado repele instantaneamente o excesso. Quem não sabe moderar-se jamais soube escrever.”

Nicolas Boileau-Despréaux
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